quarta-feira, 9 de abril de 2008


Nicholas Hughes
Kasimir Malevich

Jitet Koestana

No meio do mato
a flor branca
seu nome desconhecido

Haicai de Shiki (1869/1902).


Tradução de Maurício de Arruda Mendonça.

O poeta cubano José Kozer
LA CUEVA DE ALADINO


No cuento nada ni cuento para nada:

veinticuatro horas después di
otra vuelta alrededor de una forma
ovoide, madre original: me
entretuve viendo acabarse
el ser (individuado).
Cachumbambé (otrora).
Mecedora (allá). Temprano,
la playa (era) a la tarde la
terraza. Y ya me cayó encima
anoche la noche (ovoide).
Aplastante. Cefalalgia. El
sistema nervioso hecho un
pingajo. Inapetencia. Insomnio.
Nunca imaginé esto iba a ser
así de divertido. Y ando
implorando no quede rastro de
las vueltas dadas día a día,
todas se semejan (en la madre
ovoide) a lo ovoide de las
vueltas, nunca (en el fondo)
salí (del fondo). Variaban los
libros, yo no; seguía en pie
rigiendo el desconocimiento:
la propia fruición de la lectura
acabó por convertirse en tara
propia, inercia de la efigie
tocada de orín, violada ahí
dentro por la carcoma. A
pedazos me estoy yendo
al traste. En hora roma
me atasco. Lechuza que
no ulula. Los indicios
son claros: comienza ya
el final. Un determinismo
ingente quién lo diría rige
el Universo. Mi padre
comió chicharrones,
toneladas de carne de
vaca, y a mí el colesterol
me mata: la clave en blanco
es la Muerte. Bravo. La
brava. Vaca roja del israelí
en el desierto. Ya que esto
se acaba, raja, me voy a
largar despotricando, cantar
el manisero cagándome en
mi estampa. Hiela afuera,
nada riela: la lechuza sucumbe
en vastedad a su propio
enmudecimiento. No salir de
la cueva (jamás) de la espesura.
La lechuza enzarzada en su
matorral. El ojo invidente en
una recámara egipcia donde
duerme ya en mi nombre hace
eones el Faraón. Alma dormida,
recuerde: atónito, miro, ay no,
y cierro a cal y canto los ojos,
me obligo a volver de lleno,
entre cimeras, paramentos, los
infantes de Aragón, al centro
hueco, azul incombustible, del
sueño. Llevo un rato pensando
en los últimos años del pintor
William Turner: fue un sabio
natural, a rabiar. Haré y haré,
hari hari, poemas hasta el
final. Turner en Londres.
Margate. Me quedo en
Hallandale. Da igual. Aguantar
hasta reventar. Y nada de
visitas. Nos aguan la fiesta,
desordenándonos el día: y el
presupuesto. Dando sablazos.
Mundo indigesto. No lo trago.
Un mundo metiendo baza
donde no lo llaman. Habrá
un solo entierro al que llevaré
mi propia vela. Juan Lanas,
sin tierra: señor feudal de un
erial donde pasto (seré) de
las llamas (pagué todas las
cuotas de mi incineración).
Bailoteo. Gesticulo. Canturreo.
Vuelta más, vuelta menos,
en la ovoide. Proa al fuego,
dos lloronas (no muy bien
remuneradas): y una madre
intercesora revolviendo las
brasas.



José Kozer

Minha mãe, que era uma cozinheira de quatrocentos talheres, insuperável na igualmente insuperável culinária cabocla, costumava decretar, definitiva, que jamais honraria a cozinha quem não soubesse fazer, com talento, um arroz branco.

Desnecessário acrescentar o sublime arroz de D. Cida --- clássico, sem ademane, a nua simplicidade de um haicai. De se comer puro, só ele, feito fosse o prato principal.

Arroz incrementado, segundo ela, era tudo, menos arroz. Ou então, ironizava, abobado risoto colorido com vergonha de ser arroz... Xiita, a minha saudosa velha, nas coisas e loisas da cozinha. Frango, só o caipira; milho-verde, só o colhido no quintal, ou vindo da roça.

Minha governanta, a germana Jesse Brek, que, face ao tema, se não aparecer aqui, é capaz de entrar em greve, anda a concorrer com Matisse na disposição da mesa cá no Palacete do Tico-Tico. A cada refeição, um arranjo floral. Esses tempos, creiam, conseguiu montar um sol modernista, com pétalas de cebola e compridas tiras de cenoura. No centro, o redondo recorte de uma fatia de berinjela.

Se minha mãe era xiita no conteúdo, Frau Brek é uma fundamentalista do visual culinário. Como os japoneses, acha que a gente come primeiro, e antes de tudo, com os olhos. Boca, paladar, e até dentes, são importantes, mas vêm depois, se é que interessam vir. O que importa é a beleza inútil da poesia.

Por falar nisso, dizem, por aí, que nosso Dante Mendonça é um menestrel do forno e do fogão. Ainda não me foi dado provar suas iguarias. Mas sei que há um frango que é dele a melhor estrofe. Se é que não trouxe da Itália, onde passou as férias, e nos deixou em enorme vacância, inédito pitéu, prestes a ser anunciado...

Eu, de meu lado, quando budista, com o propósito de seguir o preceito de que todo homem deve entrar, ao menos uma vez por semana, na cozinha, tentei alguns pratos. Sou bom de frango-xadrez e não me saio de todo mal em algumas carnes ao shoyo. Aprendi que está no tempo exato de cozimento o segredo da comida chinesa, que tem de passar pelo estômago com a leveza de uma garça de Kobaiashi Issa.

Perdi o budismo e a paciência, mas não perdi o gosto por esta culinária que, embora os preços abusivos, ainda a freqüento, com a parcimônia que me permitem a disponibilidade e o bolso; mais o bolso que a disponibilidade. E ando com saudade do porco agridoce do adorável Kazuo Hidecki.

Em matéria de comida, saudade tenho sempre, e de muita gente --- do Jaime Lechinski e seus macarrões à bolonhesa; dos enfeitiçados rosbifes do saudoso Gilhobel de Camargo, mestre dos mestres; das irrepetíveis sopas-de-cebola do Jamil Snege, que chegou a ganhar as páginas da revista Claudia; das peixadas do Mazzinha; do gulache do Gilberto Rosenmann; do steak au poivre da Gleuza Salomon.

Agora, saudade, mas saudade imperecível, leitor, esta é do arroz de minha mãe.


Crônica de Wilson Bueno para O Estado do Paraná --- 6 de abril de 2008.